Primeiro Acto - Âmbito O PL118 ou Projecto de Lei nº118/XII foi apresentado por 11 deputados da bancada parlamentar do PS visa:
“Aprovar o regime jurídico da Cópia Privada e alterar o artigo 47.o do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos – Sétima alteração ao Decreto-Lei n.o 63/85, de 14 de Março”
Não sei bem em que fase do processo se encontra a aprovação deste projecto mas sei que ainda não foi aprovado, e isso é uma luz de esperança para que nunca o venha a ser.
Segundo Acto - Motivação
Numa palavra: Liberdade. Bem sei que liberdade é uma idealização de uma realidade utópica mas como em todas as utopias o verdadeiro valor está no caminho para as atingir.
Eu acredito realmente que este PL é uma afronta aos nossos direitos como cidadãos livres, direitos garantidos por nós, pela Constituição que Nós redigimos. Porquê? Porque este PL subentende que nós todos temos o potencial de infringir os direitos de um qualquer autor, mais precisamente, os direitos sobre a cópia das suas obras, mesmo que sejam cópias privadas e para uso privado e por isso faz impensável e diz: “Olhem nós sabemos que vocês não se conseguem controlar e vão fazer cópias ilegais por isso mais vale todos pagarem antes de comprarem os discos-rígidos e as máquinas de fotocópias etc…”. Isto subverte um princípio fundamental mas muita vezes esquecido no nosso estado de direito, o princípio da inocência.
Bom..eu sei que não sou inocente…e sei porque é que não sou inocente e pergunto-me se os principais interessados neste PL sabem porque é que muitas pessoas não são inocentes. O porquê das coisas é que realmente interessa para uma mudança do status quo.
Por outro lado isto é o Estado a dizer: “Nós sabemos que vocês vão consumir este produto, por isso nós vamos cobrar isto num imposto e dar o dinheiro aos ao donos dos respectivos direitos”. Estranho não é? O estado a promover um negócio, a ser um agente de cobranças de um mercado?! Onde vamos parar?!
Existem tantos aspectos fundamentalmente estranhos neste projecto-lei que é difícil explicar em poucas palavras….por isso aqui vai.
Terceiro Acto - Análise
A redacção do PL118 começa com a explicação dos seus motivos que de facto resumo tudo o que é negativo neste projecto de lei. Começa da seguinte forma:
“O presente projecto de lei visa reforçar o legítimo interesse dos diversos titulares de direitos abrangidos pelo regime normalmente designado por “cópia privada”, mediante a criação de condições que garantam a percepção de uma compensação equitativa pela reprodução de obras intelectuais, prestações e produtos legalmente protegidos…”
A mim salta-me logo a pergunta: O que é uma compensação equitativa? Melhor, quanto é?! Quem decide? Com base em quê?. Porque eu sei os preços que se praticam em Portugal sobre a venda e obras intelectuais…se calhar o problema está aí, não?! Seguindo em frente:
“Como é sabido, tradicionalmente, o uso privado de obras intelectuais, por diversas razões, tem estado fora do exclusivo reconhecido aos titulares de direitos, em sede de propriedade intelectual.”
* “O surgimento na segunda metade do século XX de equipamentos e aparelhos capazes de assegurar a reprodução em massa de obras, de uma forma incontrolada, pôs em causa o direito de reprodução de obras protegidas reconhecido aos autores, no âmbito do monopólio que lhes é legalmente outorgado, no domínio das suas faculdades de direito patrimonial e obrigou os legisladores a intervir.*"
Há uma razão muito simples por que o uso privado tem estado fora do controlo…porque se as pessoas compram devem poder usar..não?! E também…como é que querem controlar a vida pessoal?! Se eu comprar umas meias acham bem que a empresa que as faz me impeça de as emprestar ou de limitar o número de passos que dou com elas ou até os sapatos com as quais as uso?! Não só esse tipo de controlo não é razoável como é muito difícil de se fazer…e por isso não se faz! Para mim é sempre estranho quando se fazem leis cuja a aplicação é impossível de verificar, fiscalizar ou garantir.
Claro que os autores e os produtores de propriedade intelectual têm o direito de lucrar sobre o seu trabalho, óbvio e se realmente querem vender um CD de música ou um livro e proibir a sua música e obra de ser ouvida ou lida num outro formato qualquer pela pessoa que o comprou digam claramente e depois vejam o que acontece. Err….esperem….as vendas caíram a pique e as pessoas encontraram outra forma de consumir as vossas obras?! Vocês já têm a nossa resposta. Nós não queremos consumir os vossos produtos do modo como vocês insistem em dar-nos, ou melhor, vender.
Bem sei que grande parte do problema está nas editoras e nos intermediários e não nos autores….mas lá chegaremos.
“Introduzem-se igualmente inovações julgadas pertinentes e que dotam o nosso país de uma legislação actual e efectivamente protectora dos legítimos direitos e interesses dos titulares de direitos.”
Eu acho que os políticos nem fazem ideia de quem estão a proteger…os autores ou as editoras?! Aqui vai a primeira sugestão:dado carácter pessoal de uma obra intelectual proíbam a venda dos seus direitos de autor e “cópia privada” e a exploração dos mesmos por entidades que não o próprio autor. Que tal?! Já agora…parem de inovar. Vocês não têm capacidade para isso.
“De forma a acompanhar a realidade e as incessantes inovações do mercado tecnológico, o presente projecto considera que o regime deve abranger não só os aparelhos e suportes analógicos mas também os digitais,….”
Faz sentido se vão fazer alguma coisa que o façam sobre tudo mas este excerto só está aqui para me relembrar que eles de facto estão conscientes das “incessantes inovações do mercado tecnológico”.
“Quanto ao valor da taxa a aplicar sobre o preço das fotocópias relativas a obras protegidas, também este deixa de ser definido com base numa taxa de 3%, passando a ser fixada em 0,02 euros por cópia. O valor indicado teve em conta que o preço habitual no mercado de uma cópia varia entre 0,06 e 0,08 euros, pelo que parece justo que cerca de 1/4 dessa quantia reverta a favor de autores e editores. O objectivo desta solução, relativamente inovadora….”
Bom…isto é só a ponta do iceberg construído por este PL que também impõe uma taxa a fotocopiadoras, CDs, DVDs, e a maior parte dos outros suportes digitais também são taxados por uma taxa fixa entre 0.005 €/GB e 0.5€/GB. Para se ter realmente uma noção da abrangência deste PL é preciso mesmo ver o que contém mas o que está aqui exposto é o suficiente para os meus pontos de vista.
O que eu não vejo no PL é uma taxa que não seja fixa, não há nenhuma taxa em percentagem do valor dos produtos taxados, o que é realmente estúpido e revela a incompetência de quem redigiu este PL. Querem fazer uma Lei para daqui a 2 anos ou para daqui a 20 ?! É que as inovações tecnológicas evoluem mesmo muito depressa, como também tem evoluído muito o preço do GB, daqui a poucos anos estas taxas tornar-se-ão a maior parte do preço a pagar por 1 GB, o que é realmente ridículo. Nunca é boa ideia criar taxas fixas porque os preços evoluem mais depressa do que um deputado se reforma.
Outra coisa que salta à vista é de que canto obscuro tiraram estes valores?! Estudo de mercado?! Têm ideia quanto vão enriquecer a Sociedade Portuguesa de Autores?! Se taxaram o GB porque não taxam o metro quadrado de papel?! Só seria inteiramente justo e coerente….mas não, quiseram inovar.
Ah! E mais uma coisa…nenhum autor pode renunciar à sua parte do colectado por estas taxas. Estranho não?! Não posso dar, oferecer o meu trabalho, o meu tempo?! Quem são os autores?! Os sócios da SPA?! Eu também escrevo! Também faço curtas metragens com o meu telemóvel, tiro fotografias!
Se todos nós somos potenciais “copiadores” (não gosto do termo pirata, não tenho um barco) também somo potenciais autores. Como se pode cobrar a todos quando se devia pagar a todos?! 1-1= 0, matemática elementar.
Quarto Acto - Conclusões e continuação
É realmente triste ler um PL como este, porque são nestes momentos que nos apercebemos da qualidade intelectual das pessoas que elegemos. Este PL demonstra uma incompetência e ignorância sobre os assuntos que legisla inigualável.
Não só esta profunda decepção como a tentativa desesperada dos políticos defenderem um modelo de negócio obsoleto através da restrição das liberdades dos consumidores e agindo como agente de cobranças. Os autores, editoras principalmente, que estão habituadas a lucrar com pouco trabalho e a monopolizar o que as pessoas consomem culturalmente têm que aceitar as evoluções tecnológicas (pois estas trazem sempre benefícios) e adaptarem os seus modelos de negócio a uma nova realidade (a Apple já mostrou que é possível, é a empresa mais valiosa do Mundo!) onde as barreiras para a publicação e o consumo de produtos de “propriedade intelectual” são muito reduzidas.
Onde está uma loja online de livros traduzidos e músicas? As editoras e as produtores já se uniram para criar canais de distribuição e consumo com base nas novas tecnologias?! As pessoas querem consumir os vossos produto! Têm que começar repensar as vossas curvas de preço-procura! Como é óbvio os lucros têm que baixar , mas também …eram demais, verdade seja dita.
Prevejo que o papel das editoras e dos produtores seja cada vez mais diminuto e que os autores sejam verdadeiramente as pessoas a lucrar . Com isto aparecerão mais autores, mais pessoas criativas que antes das inovações tecnológicas não teriam qualquer possibilidade de mostrarem e viverem dos seus trabalhos, e isto levará ao aumento da produção cultural e acima de tudo da sua qualidade (competição, não?!).
Este PL efectivamente impede o desenvolvimento cultural do País e faz perdurar um modelo de negócio obsoleto. Os autores que defendem este PL estão efectivamente equivocados quanto à sua utilidade.
Enfim…para seguir este assunto nada melhor que seguir http://jonasnuts.com/425057.html e assinar a petição http://www.peticaopublica.com/PeticaoVer.aspx?pi=pl118nao.
E já agora não custa procurar pelo documento do PL118 no site da assembleia e ler, as páginas não são muitas.
Desculpem a seca.